O Quaternário foi marcado pela alternância de ciclos glaciais/interglaciais que modelaram os
tratos de sistemas sedimentares em plataformas continentais e formaram macro-feições, tais
como os vales incisos. A presente pesquisa tem como objetivo compreender a morfologia, as
superfícies-chave e o padrão de preenchimento sedimentar do Sistema Vale Inciso do Coreaú
(SVIC), Camocim/Ceará. Foram utilizados do banco de dados geofísicos (perfilagem sísmica
2-12 kHz e sonar de varredura lateral 100 kHz) do projeto PRONEX, cartas náuticas e folha
de bordo da DHN, compilação de dados sedimentares, imagens de veículo operado
remotamente e Landsat 5 e 8. O SVIC é formado por um Vale Principal (VP) (SSW-NNE) e
suas margens. O VP apresenta uma inflexão da isóbata de 20 metros de ~35 km em direção à
costa, este vale está a NNW da atual desembocadura do Coreaú e possui largura variando de 2
km a 20 km. O VP foi dividido em três setores de acordo com a fisiografia e presença de
falhas - interno: menores profundidades (-13 a -25m), largo (~20 km) e apresenta nítida
bifurcação; intermediário: maiores profundidades (até -40m) e confinado (~2 km); externo:
novo alargamento e possível bifurcação em paleointerflúvios. As formas de vale em U foram
os mais frequentes e espessos no SVIC. As principais orientações de vales incisos foram
SSW-NNE e ESE-WNW. Foram identificadas 5 superfícies-chave (S) e 5 unidades sísmicas
(SU). Entre o refletor mais basal (S1) e o paleointerflúvio (atual piso marinho) é verificado 40
m de dissecação, sendo assim, 20 metros de preenchimento sedimentar e outros 20 metros
sem preenchimento (vale inciso parcialmente preenchido). A S1 foi a mais antiga e associada,
provavelmente, ao embasamento acústico (Grupo Barreiras e/ou Formação Tibau), se trata de
uma discordância erosiva regional (limite de sequência). Este substrato apresentou forte
controle nos padrões de incisão e de preenchimento sedimentar. Foram evidenciados
indicadores de falha devido à presença de rupturas do relevo e escarpas íngremes retilíneas. A
S1 possui gênese associada à queda do nível de base além da quebra da plataforma 60-70m
(aumento do gradiente topográfico e do poder de incisão). Acima desta superfície e ainda no
período de mar baixo é associada à sismofácies SU2, como de gênese fluvial (Trato de
Sistema de Mar Baixo). A SU3 foi à fácies sísmica de maior abrangência (lateral e vertical)
com arranjo de refletores plano-paralelos (onlap) a inclinados (downlap). Este sistema
sedimentar (estuarino ou fluvial) foi interpretado como de baixa energia (onlap) com
transição para sistemas mais dinâmicos – migração lateral de canal (downlap) nos setores
subsuperficiais mais rasos. Sendo que ambos são relacionados ao afogamento da plataforma
continental de Camocim, devido à diminuição do gradiente e aumento do espaço de
acomodação. A S3 (Superfície Transgressiva) trunca esta unidade e marca o início do
afogamento do VP. O Trato de Sistema Transgressivo foi mais espesso nos setores
intermediário e externo, associados principalmente a calhas fluviais (depocentros). A SU4 e a
SU5 estão relacionados aos sedimentos costeiros retrabalhados e marinhos. A moderna
fisiografia e preenchimento sedimentar do SVIC são produto do último ciclo regressivotransgressivo
(Wisconsin e Holoceno), contudo, o VP, provavelmente, seja produto dos
sucessivos períodos de mar baixo relacionados aos ciclos glacioeustáticos de 100.000/400.000
anos A.P ocorridos durante o Pleistoceno. A orientação do VP, o embasamento rochoso
(Plataforma Parnaíba), os padrões morfológicos e o Grupo Barreiras deformado na foz do
Coreaú demonstram a influência da herança estrutural, porém não foi evidenciada influência
neotectônica nos sistemas sedimentares holocênicos.
Palavras-chave: Plataforma Continental. Quaternário. Variação do Nível Relativo do Mar.
Incisão Fluvial. Estratigrafia Sísmica.