RESUMO
O objeto público Resíduo Sólido Urbano (RSU), um dos principais desafios da gestão pública
contemporânea, correlaciona-se com uma série de problemas ambientais, sociais, econômicos
e culturais que emergem quando os resíduos sólidos em meio urbano não são coletados,
tratados e dispostos adequadamente. Dessa forma, a Política Nacional dos Resíduos Sólidos
trouxe em seu bojo uma hierarquia de ordem de prioridades para o tratamento dos resíduos,
sendo a reciclagem uma das alternativas. Contudo, os modelos tradicionais de políticas
públicas que vêm sendo utilizados pelos gestores públicos para mitigar os problemas dos
resíduos sólidos urbanos, principalmente os correlacionados a cadeia produtiva da reciclagem,
ainda são pautados em questões setoriais tradicionais, cujo viés setorial está muito
impregnado na estrutura social brasileira e se reflete tanto nos diferentes níveis de governo
como nas formas de organização da sociedade civil. Sendo assim, acadêmicos e especialistas
têm ressaltado a relevância da contribuição das teorias que abarcam a complexidade para a
área de políticas públicas, já que o processo político é complexo e envolve a interação de
múltiplas variáveis e diversos atores ao longo do tempo. Para além, ressalta-se uma lacuna
nos estudos dos canais de distribuição reversos (CDRs) ligados ao processo da Logística
Reversa, no que tange às relações sociais que estão diretamente relacionados à
responsabilidade compartilhada do ciclo de vida do produto. Neste sentido, o objetivo desta
dissertação é compreender criticamente o desdobramento dos processos de coleta seletiva,
considerando a interação da Administração Pública, das empresas privadas, das associações
de classe, dos catadores de resíduos e dos consumidores finais, utilizando-se dos princípios do
pensamento complexo, especificamente, no que tange aos processos emergentes decorrentes
da interação destes múltiplos atores. Especificamente, busca-se descrever as relações
existentes entre os distintos canais de distribuição reversa no processo da coleta seletiva, bem
como identificar os pontos críticos ou conflitos que prejudicam a coleta seletiva à luz do
pensamento complexo. Visando ao alcance de tais objetivos, elege-se a Região Metropolitana
de Fortaleza como campo escolhido para a execução da pesquisa, por questões de
proximidade geográfica. Metodologicamente, a pesquisa é orientada por uma abordagem
qualitativa, que se dá através de uma coleta de dados por entrevistas semiestruturadas, pela
pesquisa documental, pela participação em eventos temáticos relacionados aos RSUs e pela
observação de segunda ordem, proposta por Niklas Luhmann. Através da análise,
compreende-se que o gerenciamento dos resíduos sólidos por parte da Administração Pública, não tem proporcionado as condições suficientes para a solução dos problemas básicos dos
sistemas de resíduos das comunidades locais, ao adotar políticas públicas setoriais com
características reducionistas e lineares. Os resultados indicam que a categoria de catadores de
materiais recicláveis são os atores chaves para a condução da coleta seletiva na Região
Metropolitana de Fortaleza. Contudo, os trabalhadores deste tipo de canal de distribuição
reversa possuem parcerias fragilizadas em relação à Administração Pública, às Empresas e
aos Geradores. Ademais, a falta de fiscalização do comércio dos materiais recicláveis que
envolvem os deposeiros, contribui para a precarização do trabalho dos catadores organizados
e avulsos. Percebe-se, também, que a falta de sentido para o organizar da coleta seletiva por
parte dos geradores, dificulta o processo da logística reversa ao longo da cadeia da
reciclagem. Por fim, observa-se que a temática resíduos sólidos urbanos precisa ser debatida
em sua dimensão social, visto que, na prática, apenas impera o interesse econômico com o
controverso discurso ambiental por parte da gestão pública e empresas privadas.
Palavras-chave: Resíduos Sólidos Urbanos. Sistemas Complexos. Coleta Seletiva. Canais de
Distribuição Reversos. Políticas Públicas. Sustentabilidade.