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Repositório Institucional - UECE
Título:
“Eu fui tão feliz que dói!” - entre políticas de invisibilidade e políticas de existência: os Anacé e o Complexo Industrial e Portuário do Pecém, Ceará

Autor(es):
NÓBREGA, LUCIANA NOGUEIRA

Palavras Chaves:
Políticas de existência; povo indígena Anacé; políticas de invisibilidade; Complexo Industrial e Portuário do Pecém

Ano de Publicação:
2023

Resumo:
Esta tese aborda o Complexo Industrial e Portuário do Pecém – CIPP, no Ceará, e o povo indígena Anacé, que ocupa tradicionalmente o território-destino de recursos financeiros e de políticas de Estado voltados à instalação de indústrias e de um conjunto logístico que integra porto, rodovias e ferrovia. No contexto da relação conflituosa que se estabeleceu, interessou-me compreender, por um lado, como o Estado vai agindo para instituir objetiva, social e simbolicamente um modelo de desenvolvimento como único possível e pensável, e, por outro lado, como os Anacé se mobilizaram para, não só resistir a esse processo, mas, estabelecendo práticas, alianças e compromissos, confrontar esse “desenvolvimento” a partir de suas formas específicas de fazer mundos e de (re)produzir a vida, o que denomino de políticas de existência. Assim, busquei, a partir de análise de processos judiciais e administrativos, de notícias de jornal e de entrevistas, realizar uma anatomia da atuação do Estado no contexto do CIPP, descrevendo algumas práticas levadas a cabo por agentes públicos e privados para produzir inexistências, ou seja, para negar a presença e a existência de pessoas, de coletivos e de conhecimentos que podem colocar em risco ou questionar a arquitetura ontológica que fundamenta o Complexo e, em perspectiva mais ampliada, o próprio capitalismo. Por outro lado, ao historiar o processo de luta e de resistência Anacé para permanecer no seu território de ocupação tradicional, apresentei, com base no emaranhado da vida concreta e da lógica do encontro e da partilha, alguns exemplos das políticas de existência Anacé: as retomadas, a mezinha e as práticas de cura, as práticas alimentares, as danças e rituais, em especial, a Dança do São Gonçalo. A pesquisa de campo foi realizada junto ao povo indígena Anacé que se encontra cindido entre a Terra Tradicional e a Reserva Indígena Taba dos Anacé, criada em 2018 para abrigar parte das famílias indígenas despojadas de seu território para implantação do CIPP. Tal material foi cotejado com pesquisa documental e bibliográfica, concentrada no período de 1995 a 2022. A necessidade capitalista de fixação, previsibilidade, segurança jurídica, estabilidade das relações, homogeneização, normalização, tudo isso vai de encontro ao que os Anacé apregoam: os consensos provisórios, a diversidade, a multiplicidade de vozes e de agentes, incluindo não humanos e mais que humanos, os encantados. As plantas, as pessoas, os animais, as serras, os serrotes, as lagoas, os lagamares, os coqueiros, tudo está imbricado na rede que compõe as políticas de existência Anacé. Se nos separar de nós mesmos, dos outros, do que chamamos de natureza é a tônica do momento presente, em que mais atomização e individualização geram, inclusive, a impossibilidade de questionarmos as grandes estruturas do capitalismo, os Anacé estão fazendo esforços para recompor, restaurar e promover a reversão dessas lógicas coloniais. Estão chamando para sentir o real não mediado pelas telas e nos provocando a partir do concreto, do palpável: a comida, a dança, os encontros, a luta.

Abstract:
This thesis addresses the Pecem Industrial and Port Complex – CIPP, in the brazilian state of Ceara, and the Anacé indigenous people, who traditionally occupy the territory-destination of financial resources and State policies for the installation of industrial plants and a logistical array integrating port, roads and railways. In the context of the conflicted relationship that has been established, I have been interested in comprehending how the State acts in order to objectively, socially and symbolically institute one development model as the only one possible and even thinkable. On the other hand, I aimed to understand how the Anacé have mobilized to confront this "development", resisting this process and establishing practices, alliances and commitments, from the perspective of their own ways of creating worlds and (re)producing life, what I denominate existence politics. Thus, from the analysis of administrative and judicial cases, news, interviews, I aimed to understand the anatomy of the State’s course of actions in the context of the CIPP, describing some practices conducted by both private and public actors tending to create inexistences, in other words, to deny the presence and the existence of people, collective entities and knowledge that that might risk or question the ontological architecture that supports the Complex and, in a broader angle, capitalism itself. On another side, by practicing the historiography of the fight and the resistance by the Anacé for staying in their territory traditionally occupied, based on the tangle of real life and the logic of meetings and sharing, I have presented some examples of the existence politics of them: the retomadas, the mezinha, the cure practices, the food practices, the dances and rituals, specially the Dança do São Gonçalo. The field research was conducted alongside the Anacé Indigenous Peoples, who is currently split among the Terra Tradicional (the traditional land) and the Indigenous Reserve Taba dos Anacé, founded in 2018 to reallocate some of the families taken away from their territory for the implementation of the CIPP. This data was collated with documentary and bibliographical research, focused between 1995 and 2022. The capitalist need for fixation, predictability, legal certainty, stability of relationships, homogenization and normalization antagonizes the Anacé beliefs: the provisional consensuses, the diversity, the multiplicity of voices and agents, including non-humans and more than humans, the encantados (the enchanted ones). The plants, the peoples, the animals, the mountains, the lakes, the lagoons, the coconut trees, all is intertwined in the web that connects the existence politics of the Anacé. If the separation of ourselves from ourselves, from the others and from what we call nature is the spirit of this time, in which, atomization and individualization make it impossible to question the larger structures of capitalism, then, the Anacé are making efforts to recompose, restore and promote the reversal of this colonial logic. They are calling us to feel the real, not mediated by the screens, and provoking us from the concrete, the palpable: the food, the dance, the encounters, the fight.

Tipo do Trabalho:
Tese

Referência:
NÓBREGA, LUCIANA NOGUEIRA. “Eu fui tão feliz que dói!” - entre políticas de invisibilidade e políticas de existência: os Anacé e o Complexo Industrial e Portuário do Pecém, Ceará. 2023. 391 f. Tese (Doutorado em 2023) - Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2023. Disponível em: Acesso em: 3 de novembro de 2024

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